segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014
Felicidade
Felicidade é sentir-se bem? É gostar de viver? É amar e/ou ser amado? É ter objetivos na vida? É ter uma carreira (seja lá o que isso for)? A felicidade tem níveis (grande, pequena, assim, assim)? Duvido. Os gatos vadios que agora me invadem o quintal, passam fome, frio, lutam uns com os outros, amam-se, adoecem e julgo que também morrem. Serão felizes? Serão infelizes? Quando têm sol deitam-se e apanham-no, visivelmente deliciados. Numa qualquer cama, improvisada, dormem descontraídos. Quando comem algo, mesmo duvidoso, parece que o fazem com apetite, sem hesitação. Zangam-se mas também brincam. Não sei se são felizes, mas apostava que também não são infelizes. Em que são diferentes de mim? Por exemplo, nada comparam, aproveitam tudo o que tem utilidade imediata e nada guardam. Não pensam no dia de ontem e não receiam o de amanhã. Têm memória mas não são escravos dela nem têm ressentimentos. A memória para eles não passa dum instrumento, como os dentes, as unhas ou o olfato.
Bem, tudo isto é uma especulação minha, dum viciado em pensamentos. Mas os gatos sugerem-me que a felicidade – conceito que nós, humanos, temos sempre presente e nos preocupa tanto que até já se ter tornou disciplina científica - talvez seja um estado de indiferença a essa coisa de ser feliz ou infeliz…
(Não confundir felicidade com prazer, ou infelicidade com sofrimento. Há prazer e sofrimento que aparentemente não geram infelicidade e vice-versa. Quando agimos plenamente, quando amamos, pelejamos, construímos, destruímos, corremos, jogamos, não questionamos se somos felizes ou infelizes. Não temos tempo para isso. Só quando paramos, nos abrigamos ou procuramos refúgio, nos sentimos infelizes. Raramente, nessa circunstância, nos dizemos felizes. A felicidade, então, é algo que fica sempre lá para trás, num passado a maioria das vezes difuso…)
Essa coisa da felicidade é pois tramada, difícil de definir. Existirá? Quando se fala dela, já passou ou pura e simplesmente percebeu-se que, afinal, nunca existiu. Viver sem medo, tranquilamente, gostar de alguém, ser amado, sentir-se útil, não padecer de dores físicas e morais, não sofrer privações, dará prazer, será agradável. Mas será suficiente para gerar felicidade? O facto corrente de gente com tudo isso, com sucesso invejável, suicidar-se, parece mostrar o contrário.
Provisoriamente admito que a felicidade talvez exista, mas como “tendência para um limite”, como uma aspiração que incha ou emagrece ao sabor das contingências sempre variadas das nossas vidas. Ao fim e ao cabo talvez só sejamos verdadeiramente felizes quando não damos por isso.
Daniel D. Dias
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